Outras liberdades pelas quais lutar

Shai
4 min readMar 7, 2021

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Um dia, há alguns anos atrás, percebi que eu não tinha mais certeza de quem eu era. O mercado de trabalho havia me adoecido, meu relacionamento amoroso da época tinha me quebrado em várias partes, e eu não me identificava com nada do que eu me lembrava de mim. Eu já tinha saído da casa dos meus pais então não havia a opção de tirar um ano sabático pra reencontrar essa voz (não que morando com eles isso fosse uma opção kkkk). Foi literalmente "enquanto reza vai fazendo".

Os abusos e a perspectiva que trabalhar nas empresas me oferecia me davam cada dia mais certeza de que ali eu não iria poder realizar os sonhos ancestrais que corriam através de mim. Eu só conseguia pensar que eu estava oferecendo meu melhor para encher os bolsos de alguém, enquanto me sentia totalmente inadequada, subaproveitada e discriminada.

Mas pra empreender você precisa estar fortalecido de si. Precisa desbravar sua história, encontrar o que te impulsiona. É preciso deixar o coração falar. É uma jornada que exige coragem, e que de maneira NENHUMA é mais fácil do que um trabalho de carteira assinada só porque você está fazendo o que gosta. Pelo contrário. A diferença é que hoje eu não permito que minha subjetividade seja assassinada, nem minha criatividade apagada.

Tem também o mau geracional né: eu não empreendo como blogueira, meu negócio não é necessariamente digital, então nem sempre sobra tempo pra postar, pra atualizar as pessoas da sua vida, nem sempre sobra tempo pra mostrar uma rotina no Instagram. E Na maioria das vezes está acontecendo coisa a beça: dramas e conquistas, perrengues e euforias. Mas nós mesmas ficamos com a sensação de que não estamos fazendo "nada", porque se não tá na internet não é verdade (você também sente isso em outros aspectos da vida que eu sei).

Eu e minha amiga @marcellinhaaraujo estávamos conversando sobre isso outro dia.
Todos os dias tomamos decisões difíceis. Todos os dias somos atravessados por situações e sentimentos complicados. Todos os dias precisamos ser capazes de colocar limites em nós mesmos, na nossa equipe, nos nossos amigos, familiares, clientes e desconhecidos rs... Gestar um negócio exige equilíbrio, metodologia e continuidade. Exige que você acredite no seu àṣẹ, não nos likes.

Foi quando eu decidi criar um estúdio que me permitisse ser quem eu quisesse e me reinventasse o quanto fosse preciso para eternizar as minhas ideias. Em uma realidade que diminui e extermina nossa vivência, o que criamos através dela é o que garante nossa reexistência no futuro.

(Esse é um dos motivos, intangíveis, do porque o mercado de trabalho é tão nocivo pra pessoas pretas. Eu sentia minha criatividade, humanidade e autoconfiança morrer, e morrer com isso toda possibilidade de reexistência, minha e dos meus.)

É claro que o propósito que a gente carrega hoje foi se consolidando aos poucos. No começo eu e @wesillustra só precisávamos pagar nossas contas e parar de adoecer. Na verdade, a @mascavocriativo não nasceu como um estúdio de branding, e sim como um estúdio do que podia nos sustentar na época.

Mas criar marcas é a maneira que encontrei de viabilizar minhas ideias e ideais, cocriando com os sonhos de muita gente incrível, cheia do propósito que se alinha com o do nosso estúdio: gerar novas realidades para pessoas negras, oferecer serviços que nos reumanizam e possibilitar nosso crescimento econômico através de uma competição mais justa, uma vez que design e comunicação são formações caras e o acesso a esse serviço não fica pra trás.

Ocupar determinadas posições evoca uma confiança que nos foi negada de muitas maneiras. Eu tive minha história, vivência e experiência invalidada de muitas formas até chegar aqui. Portanto é preciso restaurar nossa autoimagem para que enfrentemos os desafios que nos impõem, como empreendedor ou não. É preciso resgatar nosso legado glorioso e aprender com as estratégias de nossos ancestrais. Verdadeiramente mudar os paradigmas.

O branding é uma construção em síntese que passa por muitos valores e percepções pessoais durante o processo, que nos ajuda a ler e entender melhor nosso caminho e como queremos expressa-lo no mundo. A maneira como fazemos lá no estúdio abraça e acolhe nesse lugar de vulnerabilidade que todos nós temos e precisamos cuidar. E eu tô super feliz por agora ter uma equipe que consegue tornar nosso serviço cada dia melhor.

Treinando e liderando pessoas você para pra pensar em toda essa trajetória que contei aqui, porque todos os dias tentamos fazer do nosso ambiente de trabalho um espaço diferente do que nos foi apresentado no mercado. Todos os dias temos diálogos que nos desenvolvem, nos acalmam e nos trazem pertencimento. Todos os dias abraçamos nossas responsabilidades individuais e coletivas sem assediar uns aos outros. Aproveito pra agradecer esse time incrível que cresce e nos ajuda a crescer.

Bem, contei várias coisas da minha história aqui pra te convidar: esse mês vou mediar a mesa "Eu, mulher preta e CEO!", uma conversa gostosa no II Festival Afroempreendedor da @afroimpacto , com outras agentes de transformação social incríveis pra falar um pouco sobre a jornada, desafios e estratégias necessárias para furar as bolhas que propomos.

Corre lá na página deles para se inscrever e dêem uma olhada nos outros conteúdos que eles prepararam, tudo pensado pra que nosso caminho seja mais leve em comunidade.

Bons ventos nos levem a prosperidade.

Aje o!

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